“Eu não sei como será a terceira guerra mundial, mas com certeza a quarta será com tacapes”. A citação profética nada otimista do futuro feita pelo gênio Albert Einstein pode ainda não ter sido levada aos cinemas em sua totalidade, mas ela flerta constantemente com a visão do cinema sobre esse assunto. Hollywood não vê no futuro chances de reconstrução no caso de desastre global. Por essa razão o mundo pós-apocalipse já teve dezenas de abordagens no cinema. Umas retratações interessantes, outras descartáveis, embora quase todas providas de uma perspectiva de futuro negra para a humanidade. E como o universo cinematográfico sempre teve fascínio pela temática, ocasionalmente volta a mexer no tema com alguma nova produção, e com a promessa embutida em sua estrutura de enriquecer o gênero de alguma forma.
“O Livro de Eli” (The Book of Eli, 2010) é um raro exemplar que leva ao espectador mais uma visão sinistra do futuro. Embora esta com um sutil diferencial: além do condicionamento e representação técnica instigante da obra (o visual é uma mistura bem realizada de vários outros filmes), “O Livro de Eli” leva em seu enredo uma crítica social diferenciada sobre a religião, fé e oportunismo que como várias obras cinematográficas que fazem menção do futuro, tem um toque de imediatismo em sua narrativa. De certo modo mexe com um assunto delicado e contemporâneo. Dirigido pelos irmãos Hughes (que retornaram ao comando de um longa após um hiato de 9 anos desde "Do Inferno, 2001") essa fita conta a história de Eli (Denzel Washington) um homem solitário e misterioso que vaga por um mundo devastado e quase desértico após um holocausto nuclear. Seu objetivo é direcionado a Costa Oeste dos Estados Unidos, onde espera encontrar civilização e levar um livro que carrega consigo. Mas em sua caminhada encontra um obstáculo materializado em Carnegie (Gary Oldman), chefe de uma pequena comunidade que sobrevive num árido deserto. Igual a Eli, Carnegie também tem um objetivo acerca desse livro: encontrar o livro cujo conteúdo lhe concederá tanto poder quanto possível. Então quando ele descobre que Eli detém esse livro, passa a caça-lo sem medir esforços para conseguir o que quer.
Apesar da estrutura dessa produção visar o óbvio entretenimento, tendo um vasto repertório de clichês de filmes do gênero em sua essência, o desenvolvimento da trama consegue equilibrar bem vários elementos diferenciados na mesma história: estilo visual, ação e um claro alerta com um toque dramático funcional. Com uma fotografia praticamente sem cores, o diretor de fotografia Don Burgess cria uma atmosfera perfeita que descreve bem a hostilidade do ambiente no qual Eli atravessa. Desde seu prólogo ao desfecho temos uma terra devastada e de difícil sobrevivência. Com cenas de ação bem orquestradas e pontuais que garantem toda a adrenalina dessa produção, também há no enredo dramático uma grande qualidade. Se pouca coisa esclarece as causas que levaram a atual condição do ambiente que estampa a película, menos informação o espectador terá sobre o herói solitário. Misterioso, preciso e de uma incomum generosidade, o ator Denzel Washington confere ao personagem um magnetismo impressionante. Ao mesmo tempo, Gary Oldman que entrega uma interpretação muito parecida com que deu a outros de seus famosos personagens (em tempos em que trabalhava frequentemente com o cineasta Luc Besson), o ator encontra um rumo tardio para sua interpretação nessa produção. O duelo de ideais travado por essas duas figuras (Carnegie quer usa-lo como ferramenta de poder e controle, enquanto Eli o vê como uma forma pura de expressão de fé) que gera os melhores momentos do desenvolvimento da história. Se roteiro de Gary Whitta desvia-se pelo uso abusivo de clichês em sua criação, ainda que demonstre toques de genialidade em seu desenvolvimento, a direção dos irmãos Hughes arredonda essa produção e equilibrar tudo de modo funcional sem deixar pontas soltas. Outro aspecto positivo seria a trilha sonora épica que acentua todo o desenvolvimento, seja nos momentos de ação como também nos de reflexão.
“O Livro de Eli” pode não ter a jornada épica de fé mais original de todos os tempos (sua inspiração vem de uma arquitetura claramente inspirada nas escrituras sagradas), mas sem dúvida é uma ótima adição ao gênero, quando os irmãos Hughes criam um mundo pós-apocalíptico plausível erguido de convencionalidades com algo a dizer além de um pedido de socorro pela sobrevivência. Mais acessível do que "A Estrada", realizado por John Hillcoat, “O Livro de Eli” conta a missão e sentença de um homem que carrega com fé e fidelidade tanto seu fardo quanto uma benção, essa desconhecida ao mundo que retardou na evolução e sugere ser um resort para homens de pouca fé e muita astúcia. Esse povo espera sem saber, que a esperança está para ganhar vida novamente, seja pela perseverança de um andarilho solitário ou pelas páginas de um livro salvo de uma campanha incendiária.
Nota: 9/10
Nota: 9/10
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