sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Crítica: Melancolia | Um Filme de Lars Von Trier (2011)



A notoriedade que os projetos cinematográficos de Lars Von Trier alcançam por sua excelência – “Dogville, “Manderlay” e “Os Idiotas” – são exemplos de sua aptidão para o cinema. Mas além da repercussão que seus filmes em geral conquistam perante a crítica e o público, ocasionalmente o cineasta consegue de forma inesperada o impossível.  No caso de “Melancolia” (Melancholia, 2011), ele conseguiu desastrosamente minar sua própria figura, e consequentemente a de seu filme perante o júri de um dos mais renomados festivais de cinema do mundo devido a uma série de declarações provocativas. Tentou fazer graça em Cannes e se deu mal. Se queria chamar a atenção conseguiu, mas de forma negativa. E se tivesse dito que o filme ficou uma droga e foi lançado porque era impossível ter feito coisa melhor e como já estava pronto, apenas deu segmento ao próximo passo – a exibição pública – toda plateia teria dado gargalhadas. Quem conhece seu trabalho sabe que o cara é fera ao seu modo, de contar uma história com habilidade e sensibilidade. Mas não, o cineasta teve que mexer em um terreno espinhoso que é o nazismo numa cerimônia que não tem nada a ver com a história. Sua aversão à cultura estadunidense é bem conhecida, mas declamar simpatia ao regime nazista, ai é demais! O que ferrou a chances de seu longa ganhar a Palma de Ouro em Cannes, apesar de a protagonista Kirsten Dunst conquistar o prêmio de melhor atriz no mesmo festival. Com a expulsão do evento veio o arrependimento tardio. 

A história do filme retrata duas irmãs, onde uma delas noiva, Justine (Kirsten Dunst), esta prestes a se casar com Michael (Alexander Skarsgard). A outra irmã, mais vividamente experiente, Claire (Charlotte Gainsbourg), casada com John (Kiefer Sutherland), tem suas relações familiares dissecadas profundamente. Na primeira parte do filme, acompanhamos as nuances cerimoniais do casamento e a relação das irmãs afastadas pelo tempo e suas diferenças. Mas na segunda parte, quando há o anúncio da colisão de um planeta chamado Melancolia com a atmosfera terrestre, muita coisa muda e devido ao eminente Apocalipse, a inevitável catástrofe desencadeia diferentes reações pessoais. O filme acompanha o evento do casamento de forma convencional, como se espera, dando o devido destaque à noiva. Kirsten Dunst está ótima, e talvez num de seus mais expressivos trabalhos, dá o tom exato da melancolia que dá título a essa produção. Conformada com o eminente desastre resta acompanharmos o desespero de Claire, apavorada com o fim do mundo. E é nesse trecho que que se justifica a escolha do título dessa fita. O roteiro, também de autoria de Lars Von Trier acentua as reações e as diferenças das mulheres que despertam as atenções do espectador, concentrando o foco da trama num elenco contado de forma profunda mesmo num enredo de proporções épicas como o fim do mundo. E a direção, que nas mãos de um cineasta menos preparado poderia ruir um projeto das pretensões que o enredo extraordinário desse longa estampa, é conduzido com perfeição.

O restante do elenco até tenta, mas não consegue roubar a cena, pois a condução da trama deixa claro à quem pertence esse longa-metragem. Com uma produção bem elaborada e uma direção de fotografia belíssima de responsabilidade de Manoel Alberto Claro, dando os contornos que esse longa-metragem necessita, Lars Von Trier apresenta o resultado visual que flerta com maneirismos do cinema independente (câmera tremula e vibrante em tons sombreados). Dentre os filmes da autoria do cineasta dinamarquês, “Melancolia” pode ser considerado um de seus trabalhos mais acessíveis. Apesar de lento, recheados de devaneios visuais ao som de “Tristão e Isolda” de Richard Wagner, pode ser considerado por muitos como excessivamente chato. Afinal, esse longa é uma lição de vida a ser relembrada novamente, pela visão de um cineasta corajoso que se presta a tarefa de mostrar que certos relacionamentos se fortalecem diante de uma tragédia iminente. Poucos diretores conseguem espremer do fatalismo sentimentos dramáticos tão satisfatórios com tanta competência.   

Nota: 7/10

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