terça-feira, 20 de maio de 2014

Crítica: Vovô Sem Vergonha | Um Filme de Jeff Tremaine (2013)


Irving Zisman (Johnny Knoxville) é um senhor de 86 anos atormentado pela presença de seu neto de oito anos, Billy (Jackson Nicoll), logo após a morte de sua esposa. Decidido a se livrar do neto após sua mãe ser presa, os dois entram numa jornada pela América em direção à Carolina do Norte para deixar a tutela com o pai. Durante a viagem, Irving Zisman e Billy passam por lugares e situações absurdas e despertam as mais estranhas reações das pessoas que cruzam o caminho deles. “Vovô Sem Vergonha” (Jackass Presents: Bad Grandpa, 2013) é uma comédia com a assinatura “Jackass” dirigida por Jeff Tremaine e estrelada por Johnny Knoxville e Jackson Nicoll. Ainda produzido pela MTV Films, essa produção foi escrita pelo próprio Jeff Tremaine, Johnny Knoxville e por Spike Jonze com uma proposta um pouco diferenciada do extremismo demonstrado na franquia “Jackass. Através dessa produção eles buscam (ao seu modo) conferir um pouco de dramaticidade para um fiapo de história deixando de lado os perigos ao qual o elenco se sujeitava, para agora se envolver em situações surreais que desencadeiam as mais inusitadas reações do público envolvido. Por isso, “Vovô Sem Vergonha” como proposta cinematográfica não seria sequer digno de ganhar uma nota tamanha suas limitações. Entretanto, aos fãs de pegadinhas pode até agradar, e vai, por causa de algumas situações escatológicas que geram alguns bons momentos de diversão e risadas, ainda que não sejam tão frequentes como nos filmes da série “Jackass. Portanto, “Vovô Sem Vergonha” é uma piada estendida com altos e baixos.

Censurado para menores de 14 anos, “Vovô Sem Vergonha” é baseado numa esquete onde Johnny Knoxville se fantasiava como um velhinho acompanhado com um garoto onde ambos se comportam de forma politicamente incorreta. Sucesso levado às telas como um longa com direito a começo, meio e fim definido de modo irregular. Levando-se em conta o desenvolvimento degenerado da produção, Johnny Knoxville abre a caixa de pandora das possibilidades para gerar as mais inusitadas grosserias captadas pela câmera de Jeff Tremaine (através de câmeras escondidas e disfarçadas no ambiente de forma bem competente). Além do envolvente personagem mirim que gera reações de constrangimento do público atuante e desavisado, os dois formam uma divertida parceria. Embora a trama seja estruturada de forma artificial, as atuações sejam marcadas de muito improviso, há um coerente enredo sendo transposto em meio as enganações. Um aspecto que o diferencia dos demais filmes da série “Jackass”, ainda que seja genialmente desenvolvido, já que sua estética remeta em muito ao formato televisivo sem grandes novidades. “Vovô Sem Vergonha” tem bons momentos de humor não restam dúvidas, como também é certo que não agrada a todos os públicos. Destaque para o momento “Miss Sunshine”, com reações tão hilárias quanto do filme original. Além é claro, como o obsceno strip-tease do velho Irving numa casa de shows feminina que extrapola os limites possíveis da grosseria. Pontos para os erros de gravação e a demonstração da ciência por trás da ilusão obtida desse longa.

Nota:  7/10   
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segunda-feira, 12 de maio de 2014

Crítica: O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus | Um Filme de Terry Gilliam (2009)


Estamos na Inglaterra e um grupo teatral chamado “O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus” vaga pelas ruas de Londres na clandestinidade em busca de público para suas apresentações itinerantes. O grupo comandado pelo beberão imortal Doutor Parnassus (Christopher Plummer), além do mágico de truques baratos Anton (Andrew Garfield), pelo anão e eterno amigo do doutor, Percy (Verne Troyer) e por sua linda filha, Valentina (Lili Cole), a companhia oferece ao público um espetáculo diferenciado. O espetáculo é capaz de levar o espectador através de um espelho mágico a um mundo fantástico e inexplorado da imaginação ligado à mente do Doutor Parnassus, no qual esse show surgiu, como a imortalidade do Doutor, de um pacto com o Diabo no qual o pagamento seria a alma de sua filha quando completasse 16 anos. E com essa data se aproximando, o Diabo (Tom Waits) volta para cobrar a dívida. Com a certeza que iria perder sua filha, esperançoso Parnassus realiza uma nova aposta: quem conseguir seduzir primeiro a alma de cinco pessoas terá posse de Valentina. E quando as coisas iam mal, surge o aparentemente desmemoriado Anthony “Tony” Shepherd (Heath Ledger), para ajudar Parnassus a salvar Valentina. “O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus” (The Imaginarium of Doctor Parnassus, 2009) é um longa-metragem independente de fantasia dirigido pelo lendário cineasta Terry Gilliam (responsável por “Brazil” (1985), “12 Macacos” (1995), “Medo e Delírio (1998), “Os Irmãos Grimm” (2005), entre outras produções). Com uma narrativa gritantemente nonsense, Gilliam, um dos sobreviventes do icônico “Monty Phyton” (1975) cria um trabalho repleto de simbolismos visuais delirantes materializados nos sonhos que deve ser lembrado não apenas sendo a última performance de Heath Ledger em vida, mas como uma divertida fantasia para adultos, diferente do que a maioria das pessoas estão habituadas a ver.
  
Como é de conhecimento público, Heath Ledger morreu enquanto o longa-metragem estava sendo filmado, e por essa razão, o trabalho do ator foi complementado com o envolvimento de Johnny Depp, Jude Law e Colin Farrel na produção. Ledger havia realizado cerca de um terço de suas cenas, e para que todo seu trabalho não fosse descartado algumas decisões estratégicas foram tomadas para se mantivesse a integridade do trabalho já realizado. Devido a isso, parte do roteiro de Terry Gilliam e Charles McKeown teve de ser reescrito para adequar as inesperadas mudanças ocasionadas pela fatalidade. Alterações essas bem pontuadas que não prejudicaram em quase nada (há um convincente justificativa para que Heath Ledger demonstre mudanças físicas em sua face estando no mundo de Parnassus), incrementado o conjunto da obra em sua totalidade como a própria permanência do ator no filme. Mas ainda assim, “O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus” soa levemente inacabado, ainda que isso não gere um incômodo gritante. Talvez apenas presente no ritmo do desdobramento da trama. Da premissa interessante de um primeiro ato de descobertas necessárias ao espectador, Gilliam conduz um desenvolvimento de pouca clareza e sem tensões e emoções que se façam valer realmente. Ainda que o visual criativamente belo conferido por efeitos visuais modernos associados a técnicas de animação tradicionais alegrem os sentidos, o espectador pode sentir estranheza pela fundamentação das ideias opacas de seu realizador, que culminam num terceiro ato coerente com ares de reviravolta com um bom nível de genialidade, embora não seja dos melhores de sua filmografia. Como Heath Ledger, a grande estrela do elenco ausente, Johnny Depp transpôs a melhor continuidade de seu trabalho (em aparência estética e comportamental), ainda que a apresentação do destino de seu personagem tenha caído nas mãos de um Colin Farrel exagerado e não tão funcional como se esperaria de um ator de seu quilate.

O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus estreou no Festival de Cannes de 2009 fora da competição, e depois participou em vários outros festivais pelo mundo. Concorreu ao Oscar 2010 nas categorias de Melhor Direção de Arte e Melhor Figurino, aos quais não abocanhou nenhum deles. Como homenagem ao falecido ator, Gilliam alterou os créditos do filme de “Um Filme de Terry Gillian” para “Um Filme dos Amigos de Heath Ledger”. Em resumo, essa produção tem o seu charme desde que o espectador o veja com olhos e cabeça aberta. Querendo ou não, trata-se de uma fábula direcionada a um público maduro que nem sempre vê essas produções como as mais atraentes, ainda que tenha uma perspectiva bem criativa sobre escolhas e sonhos adiados com sutil toque crítico.

Nota:  7/10  

sábado, 10 de maio de 2014

Crítica: Anjos e Demônios | Um Filme de Ron Howard (2009)


Diante da misteriosa morte do Papa e do sequestro dos principais candidatos a sua sucessão, evidências indicam que há um inesperado ressurgimento de uma antiga sociedade secreta que marcou a história do cristianismo chamada Illuninati. Com isso o simbologista Robert Langdon (Tom Hanks) é chamado pelo Vaticano a Roma para ajudar a decifrar um mistério por trás dessa sociedade secreta antes que um novo experimento científico exploda a cidade. Para isso Langdon junta forças com uma cientista italiana chamada Vittoria Vetra (Ayete Zurer), e juntos buscam pistas numa frenética caçada pelas redondezas de Roma antes que seja tarde demais para salvar os reféns, como o próprio Vaticano. "Anjos e Demônios" (Angels & Demons, 2009) é thriller de suspense dirigido pelo diretor e ator americano Ron Howard (responsável por filmes como: "Uma Mente Brilhante" e "Frost/Nixon", além dos icônicos "Cocoon" e "Apolo 13"). Baseado no livro de mesmo título escrito por Dan Brown, "Anjos e Demônios" funciona como uma sequência de outro sucesso do escritor chamado "O Código da Vinci" também transposto para o cinema por Ron Howard em 2006. Embora um sucesso de bilheteria a produção foi imensamente criticada, seja pelo público ou pela própria Igreja Católica a qual o enredo importuna. Naturalmente, já que o livro de Dan Brown também teve grande repercussão nos canais de comunicação após as autoridades eclesiásticas insistirem em censurá-lo por revelar certos aspectos ligados as suas metodologias de doutrinação, como certas ideias a respeito de Jesus Cristo bem diferentes do que é de conhecimento público. O livro foi rodeado de polêmicas, umas interessantes enquanto outras mais sensacionalistas. O longa-metragem "Código da Vinci" tinha suas qualidades, apesar de dividir as opiniões da crítica especializada no mundo todo. "Anjos e Demônios" é um corajoso retorno do cineasta (como também de Tom Hanks ao personagem simbologista Robert Langdon) com o intuito de criar um filme mais decidido, sobretudo que agrade gregos e troianos (conhecedores ou não da obra de Dan Brown).



Em suma, "Anjos e Demônios" se mostra melhor do que seu antecessor cinematográfico, ainda que esteja distante de ser impecável. À prova de polêmicas, essa produção está mais para uma aventura turística (a trama se desdobra por locações fantásticas que ganharam contornos de grande beleza pela câmera de Ron Howard) onde seu protagonista, Robert Langdon sugere ser uma espécie de Indiana Jones contemporâneo. Várias locações foram brilhantemente reproduzidas pela produção (como a Praça de São Pedro e a Basílica) já que Howard foi impedido de filmar no interior do Vaticano. Em comparação ao filme anterior, esse longa-metragem tem mais ritmo dado por uma correria de gato e rato bem conduzida, fazendo com que "Anjos e Demônios" tenha em sua narrativa mais emoção. Portanto, o roteiro (de responsabilidade de Akiva Goldsman e David Koepp) está repleto de concessões de sua inspiração literária, mas preservado em sua essência numa transposição voltada para ser um produto de entretenimento muito mais empolgante. E talvez, esse aspecto seja a melhor sacada dessa produção em comparação ao filme anterior de Ron Howard, excessivamente burocrático e ligeiramente entediante que se revelou sendo apenas um livro filmado (certamente que as aulas de história proferidas de modo massante minaram qualquer chance de cativar um público que esperava mais de um best-seller). Há passagens inteligentes também (como alguns aspectos dos bastidores da eleição do Papa) apresentadas de forma didática por Ron Howard, porém essas passagens são debilitadas em sua totalidade por causa de outras menos convincentes. Algo muito positivo em "Anjos e Demônios" seria a presença de Tom Hanks (repetindo o papel de simbologista, agora curiosamente mais a vontade do que na primeira vez), como também os demais atores do elenco principal que se mostram boas escolhas, ao quais alguns inclusive oscilam entre a inocência e a culpa de modo genial. Com boas passagens de humor (como a reação de vandalismo protagonizada por Ayelet Zurer devido as circunstâncias da ação) contrastam com a adrenalina e o suspense da caçada que ocorre por becos e catedrais centenárias.

Tentando corrigir os erros ocorridos no passado, tanto Ron Howard como Tom Hanks voltam a trabalhar juntos nessa produção reescrevendo a história na qual ateus e religiosos, a religião e a ciência se confrontam revivendo eventos pouco conhecidos do cristianismo num desenvolvimento moderno, mas prejudicado inevitavelmente por um clímax exagerado que resultou em um desfecho inverosímel (um ato heroico gratificado com uma nomeação ao papado é demasiadamente forçado em uma produção que claramente se esforçou em manter um nível de fidelidade aos ritos religiosos do Vaticano por todo o desenvolvimento). Por fim, "Anjos e Demônios" se mostra uma adaptação inteligente do sucesso literário de Dan Brown. Ao invés de recriar a obra de Brown com perfeição, com todas as falhas literárias que acompanham a falsa história do autor, Howard criou um thriller de suspense com outras diferentes, mas favorecendo seu trabalho com um ritmo ágil e uma força envolvente.

Nota:   7,5/10


quinta-feira, 8 de maio de 2014

Crítica: O Gosto da Vingança | Um Filme de Jin-woon Kim (2005)


Sun-woo (Lee Byung-ah) é um competente gerente de um restaurante sofisticado numa área nobre de Seul chamada La Dolce Vita. Mas além de exercer essa função profissional, ele também tem outro emprego como garoto de recado para um poderoso chefe da máfia coreana chamado Kang (Kim Yeong-cheol) que delega uma tarefa de grande importância. Sun-woo precisa vigiar a jovem namorada de Kang, Hee-soo (Shin Min-ah) com o intuito de descobrir se ela tem um amante, e caso a suspeita se confirme, ele deve mata-los. E logo a suspeita se confirma, porém Sun-woo toma uma decisão arriscada e inesperada ao permitir que o casal parta ileso das consequências. Entretanto, chega ao conhecimento de Kang o ocorrido, onde Sun-woo é sentenciado à morte, que responde a altura reagindo com uma vingança sangrenta sobre a máfia coreana. “O Gosto da Vingança” (Dalkomhan insaeng, A Bittersweet Life, 2005) é um filme de ação noir escrito e dirigido por Jin-woon Kim (responsável pelo terror “A Tale of Two Sisters”, que por aqui foi intitulado apenas como “Medo”, um filme hit de 2003). “O Gosto da Vingança” é um ótimo filme de ação e suspense vindo da Coreia do Sul que aborda mais uma vez a temática da vingança de forma magistral. Se já não bastasse os brilhantes filmes de Chan-wook Park (responsável pela icônica Trilogia da Vingança), Jin-woon Kim cria um longa-metragem repleto de particulares características do cinema coreano com algo mais.


Os cineastas coreanos não conhecem a palavra “moderação”. Jin-woon Kim não é diferente dos demais. A ação projetada é visceral, de um realismo brutal materializado numa violência explícita que contrasta com um lirismo filosófico muito bem-vindo, seja em palavras ou em imagens. Dirigido com arrojo, a câmera frenética nunca se perde pela película confundindo o espectador, e a violência extremada sempre se mostra significativa dentro do contexto. Trata-se de uma produção que exibe morte a nível atacadista, onde sangue jorra sem economias, ossos se quebram com facilidade e a dor é quase palpável. Mas isso é apenas um dos elementos que compõem o conjunto de “O Gosto da Vingança”, sendo que a trama que se mostra em premissa simples, segue assim sem reviravoltas complexas, mas com muita tensão e emoção conferida pela profundidade das atuações honestas entregues pelo elenco. A presença de Lee Byung-ah (que após uma vida de erros decide pela primeira vez fazer a coisa certa) destaca-se perante outras, embora todo o elenco funcione redondamente com a proposta do diretor. Essa produção poderia ser acusada de que o sangue que escorre pelos corredores seria apenas uma solução apelativa para camuflar deficiências, mas não, já que ela funciona apenas como um elemento intermediário para as ligações humanas presentes na história de vingança resultante da quebra de um código de honra do submundo do crime. Como a ação brilhantemente coreografada, não devendo em nada para produções chinesas, enriquecem o visual e a estética concretamente bem delineada pela soberba condução de Jin-woon Kim.

Em resumo, “O Gosto da Vingança” é um filme de estética sólida e de uma transparente profundidade. Entre confrontos armados de violência visceral capaz de causar náuseas ao espectador, o público é brindado com momentos de calmaria que o familiarizam com as emoções dos personagens. Uma realização de vingança fenomenal, tanto no desenvolvimento da trama (atribuída por um roteiro envolvente) como na forma que é apresentada oscilando entre a crueza e a delicadez. É quase impossível não torcermos pelo homem que encontrou sua redenção através de uma atitude de barbárie materializada na vingança. Altamente recomendado!

Nota:  9/10


quarta-feira, 7 de maio de 2014

Crítica: Gigantes de Aço | Um Filme de Shawn Levy (2011)


O ano é 2020, numa época onde ao invés de haver lutas com esportistas humanos passou-se a se utilizar sofisticados robôs de luta para entreter plateias. Um sensacional espetáculo que levava o público ao delírio e passou a ser uma permanente sensação mundial. Charlie Kenton (Hugh Jackman) é um ex-lutador de boxe fracassado, que desiludido após o crescente desinteresse do público em lutas com pessoas reais busca sobreviver comercializando peças velhas de robôs sem grandes lucros, além de promover combates com lendários robôs sucateados. Com sérios problemas financeiros, num inoportuno momento Charlie é forçado a cuidar de seu distanciado filho de 11 anos, Max (Dakota Goyo) para saldar suas dívidas. Relação esta, turbulenta a princípio na qual uma crescente amizade vem sendo fundida pelo inesperado desempenho de um ultrapassado robô de luta chamado Atom que foi resgatado da sucata e vem ganhando evidência diante de gigantes do ringue. “Gigantes de Aço” (Real Steel, 2011) é uma produção estadunidense de ficção cientifica dirigida por Shawn Levy (deUma Noite no Museu 1 e 2”), que vem com uma proposta de entretenimento que visa mesclar os clichês de filmes de boxe com uma estética robótica erguida com efeitos visuais muito bem projetados. Embora o enredo tenha em seu esqueleto grande potencial pelas mensagens encrustadas em sua narrativa, o roteiro (escrito a três mãos por John Gattins, Dan Gilroy e Jeremy Leven com base de um conto de Richard Mathenson) demonstra ter sido muito mal explorado pelo resultado limitado. Em suma, Shawn Levy entrega um filme simplesmente divertido (para a família) nos moldes de produções da Disney onde crianças têm papéis valorizados e o filme ainda pode produzir inúmeros brinquedos colecionáveis. 

Gigantes de Aço” tem uma intrigante promessa possibilitada por efeitos visuais modernos compilados com técnicas de animação tradicionais que geraram uma indicação ao Oscar 2012 de Efeitos Visuais. Mas não é nas inovações tecnológicas que essa produção busca envolver o espectador (ou pelo menos deveria), e sim, na conflitante relação entre pai e filho protagonizada por Hugh Jackman e Dakota Goyo que até certo ponto, empolga e diverte com um bom nível de emoção em função de algumas passagens cômicas bem distribuídas pelo desenvolvimento. Apesar de que quando os robôs entram em cena, a película ganha um brilho especial que atende ao anseio e expectativas do público de ver com um pouco mais de nitidez o que se sugere nos trailers: fantásticos roubos brilhantemente estilizados que compõem uma gama variada de personagens mecânicos. Robôs que também tem força dramática e esbanjam estilo visual, seja apenas em sua aparência ou nas cenas de ação que se materializam em lutas engenhosamente montadas. Entretanto, não há produção que prospere de modo expressivo somente se apoiando com a estética, já que a trama não é realmente intrigante. Observando que as relações humanas carecem de coração, principalmente em função do limitado desempenho do elenco principal e do desdobramento dos acontecimentos, o filme perde um pouco de seu carisma. Hugh Jackman se mostra pouco evoluído emocionalmente na paternidade, como Dakota Goyo se desprendeu da figura de garoto mimado cheio de razão sem conseguir convencer verdadeiramente. O crescimento de ambos soa ligeiramente artificial. Além do lógico romance entre Hugh Jackman com Evangeline Lily, uma antiga amiga e companheira nas horas difíceis de Charlie Kenton. Há uma justificável presença para todos os personagens, mas que foram muito mal explorados dentro do conjunto. E se funciona razoavelmente bem é devido ao conjunto técnico que chama a atenção e desencadeia empolgação.

Se o elenco não emplaca a dramaticidade necessária para que “Gigantes de Aço” seja realmente grandioso, em contrapartida o conjunto técnico (que além dos efeitos visuais dedilhados por Steven Spielberg através da DreamWorks Pictures) também é composto por uma montagem habilidosa de Dean Zimmerman e uma trilha sonora bem pontuada, essa de responsabilidade do experiente Danny Elfmann que desperta emoções aprisionadas no espectador compensam as faltas de desempenho do elenco principal. E a sacada de mesclar diferentes gêneros em uma única produção não é de todo mal, porém também não mostra nada que ainda não tenha sido visto antes. Ganha preciosos pontos por algumas mensagens de alerta (como a manipulação dos esportes de massa por grandes corporações), gritada em um clímax estranho que mostra que grandes batalhas não são feitas somente de nocautes. Articulando estrategicamente aspectos narrativos de Balboa com uma estética Transformers, o trabalho de Shawn Levy tem o seu valor como produto de entretenimento leve e descompromissado para a família. Qualquer aposta acima disso, pode causar descontentamento.

Nota:  7/10

terça-feira, 6 de maio de 2014

Crítica: A Perseguição | Um Filme de Joe Carnahan (2011)


Num descontraído retorno para casa após meses trabalhando em um posto de extração de petróleo no Alasca, um grupo de operários de uma empresa petrolífera sofre um acidente aéreo que os deixam isolados nas montanhas. Além da hostilidade climática da gélida região, do despreparo dos sobreviventes e da eminente escassez de comida que está por vir, os operários são surpreendidos por constantes ataques de lobos de habitam a região. Entre o impasse de esperar o resgate ou encontrar ajuda em uma ameaçadora jornada, Ottway (Liam Neeson) lidera os poucos sobreviventes que ainda restam pelas montanhas para conseguir fugir da ameaça dos lobos. “A Perseguição” (The Grey, 2011) é um thriller de suspense dirigido por Joe Carnahan, responsável pelos exageradosEsquadrão Classe Ae peloA Última Cartada 1 e 2. Se o uso descontrolado da artificialidade marcou grande parte de sua filmografia, através de “A Perseguição” ele encontrou o tom certo para gerar um filme que atenda as expectativas dos tempos de “Narc”; mostrando toda sua capacidade de realização com poucos recursos a mão. Distante de ser um filme de ação como nos quais seu protagonista, Liam Neeson está cada vez mais envolvido em sua carreira, essa produção também não se resume a apenas mais um filme de sobrevivência focada no confronto homem versus natureza como dezenas de produções do gênero. “A Perseguição” tem um curioso equilíbrio dinâmico bem climatizado por recursos nada artificiais. Bem estrelado pelo astro e conduzido de forma competente, Joe Carnahan mostra curiosamente que é capaz de fazer mais com menos.

O cenário natural composto por montanhas geladas e um fascinante protagonista são os elementos iniciais desse grande filme. “A Perseguição” é um conjunto de muitos outros elementos muito bem elaborados, que vão do roteiro do próprio Carnahan num trabalho conjunto com Ian MacKenzie Jeffers, à direção de fotografia de Masanobu Takayanagi que retrata com perfeição o inóspito território em que os personagens se encontram. Bem ambientado (o filme foi rodado nas montanhas do Canadá), angustiante e tenso como um bom suspense deve ser, o espectador acompanha uma surpreendente busca pela sobrevivência, além de inesperados momentos de reflexão que é uma ótima sacada do roteiro. Diálogos e situações projetadas que despertam emoções no público aliviando a tensão extrema das circunstâncias, mas que não diminuem o envolvimento do espectador com o desenvolvimento da ação. Ação essa que surge ou não, da aparição dos predadores famintos mostrados com descrição e de forma pontual. Se Joe Carnahan acerta na configuração de sua trama e principalmente na condução dela (embora o desfecho gere discussões e dúvidas), seu maior acerto é a parceria com Liam Neeson, um experiente e talentoso ator que cada vez mais tem angariado novos fãs através de papéis que requerem um desempenho físico extenuante (Neeson não deixa a desejar em nada em comparação a atores mais jovens e dispostos fisicamente). Embora todo elenco de apoio (Frank Grillo, Dermot Mulroney, Dallas Roberts, Joe Anderson entre outros) funcione de acordo como preciso, nenhum deles consegue rivalizar com o astro de modo expressivo. Sobretudo, “A Perseguição” é um fascinante duelo entre o homem e as forças da natureza, onde a busca pela sobrevivência não é apenas um teste de superação, mas uma prova de vida ou morte. E considerando os filmes anteriores de Joe Carnahan, ele também pode sobreviver ao se afastar da selva de Hollywood.

Nota:  8,0/10

sábado, 3 de maio de 2014

Crítica: Fale com Ela | Um Filme de Pedro Almodóvar (2002)


Benigno (Javier Cámara) é um enfermeiro que mora em frente a uma academia de balé na cidade de Madri. Benigno frequentemente observa da janela de sua casa as aulas que ocorrem na academia, onde sua atenção é direcionada a uma das aulas em especial. Sem nunca ter falado com essa aluna, Alicia Roncero (Leonor Watling) ele alimenta uma paixão platônica pela moça. Certo dia o destino leva Alicia a se envolver em um acidente de automóvel que a deixa em coma, fazendo com que Benigno por obra do destino também passe a cuidar dela no hospital numa mistura de fé por sua melhora e amor. Em paralelo ele acaba conhecendo Marco (Darío Grandinetti) um jornalista que zela pelo futuro de sua recém-namorada, Lydia González (Rosário Flores) uma famosa torreira que sofreu um acidente durante uma tourada que também a levou a ficar em coma. Por meio das tragédias que abateram essas mulheres, surge uma amizade na qual sem poderem fazer nada efetivamente para melhora delas, apenas falam com elas. “Fale com Ela” (Hable con Ella, 2002) é um filme dramático espanhol escrito e dirigido por Pedro Almodóvar (realizador de “Tudo Sobre Minha Mãe, premiado com o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro). “Fale com Ela” aborda temas arrebatadores que mostram ao espectador a visão autoral do cineasta sobre o amor incondicional, estupro e além de alguns aspectos interessantes sobre estranhos relacionamentos entre homens e mulheres (até mesmo quando as mulheres estão inconscientes no fundo de uma cama de hospital).

As mulheres sempre foram o grande foco do trabalho de Almodóvar. Basta o espectador ver com cuidado a filmografia do cineasta para constatar esse curioso e fascinante foco. Em “Fale com Ela”, mesmo não sendo elas as grandes intérpretes dessa produção, Rosário Flores e Leonor Watling são ainda assim o grande destaque, já que toda trama criada pelo espanhol gira em volta de suas personagens. Sobretudo, os personagens masculinos interpretados por Javier Cámara e Darío Grandinetti, com suas histórias e particularidades são os que sustentam o desdobramento da trama de Pedro Almodóvar. Com uma abordagem mais contida, visualmente menos gritante do que em seus trabalhos anteriores, essa produção tem sim em sua essência as características do autor, ainda que diferente do que se esperava do cineasta na época. Tem uma história intensa, que aborda temas fortes que são contados de modo fluente. Pedro Almodóvar esbanja capacidade ao contar essa história de modo sensível e com profundidade, mostrando porque ele é um dos mais influentes cineastas espanhóis contemporâneos. Resumidamente, “Fale com Ela” não é um dos melhores filmes do cineasta, mas é um dos seus filmes mais comportados em termos de estética; estética essa que inclusive supera o seu próprio texto, já que a história em si contada em uma simples sinopse, como seus personagens também demonstram ter um evidente amadurecimento. Trata-se de um bom filme imprescindível de sua filmografia, embora não seja o de maior destaque.

Nota: 7/10